quinta-feira, 2 de maio de 2013

ESQUECIMENTO DO PASSADO


ESQUECIMENTO DO PASSADO
Estudo com base in O Livro dos Espíritos, Livro segundo, cap. VII, Retorno à Vida Corporal, itens de 392 à 399.
Obra codificada por Allan Kardec
Pesquisa: Elio Mollo
02/05/2013
Atualizado em 06/05/2013


O Espírito encarnado perde a lembrança do passado porque o homem nem pode nem deve saber tudo. Deus na sua sabedoria, lhe colocou uma espécie de véu que lhe encobre certas coisas, assim, sem esse véu o homem ficaria ofuscado, como aquele que passa sem transição da obscuridade para a luz. Pelo esquecimento do passado ele se mostra tal qual ele é. Contudo, ao Espírito encarnado, ainda lhe resta uma vaga lembrança, que lhe dá o que chamamos ideias inatas. (1)

O Espírito não é um ser novo, por isso, quando nasce, traz as ideias, as qualidades e as imperfeições que possuía de outras existências. É assim que pode-se explicar as ideias, as aptidões e as tendências inatas. (2) Se não temos, durante a vida corpórea, uma lembrança precisa daquilo que fomos, e do que fizemos de bem ou de mal em nossas existências anteriores, temos, entretanto, a sua intuição. E as nossas tendências instintivas são uma reminiscência do nosso passado, às quais a nossa consciência, que representa o desejo por nós concebido de não mais cometer as mesmas faltas, nos adverte que devemos resistir.

O Espírito sendo o mesmo, nas diversas encarnações, suas manifestações podem ter, de uma para outra, certas semelhanças. Estas, entretanto, serão modificadas pelos costumes da nova posição, até que um aperfeiçoamento notável venha a mudar completamente o seu caráter, pois de orgulhoso e mau pode tornar-se humilde e humano, desde que se haja arrependido. (3)

A cada nova existência o homem tem mais inteligência e pode melhor distinguir o bem e o mal. Se ele se recordasse de todo o passado não teria mérito nenhum. Quando o Espírito entra na sua vida de origem (a vida espírita), toda a sua vida passada se desenrola diante dele; vê as faltas cometidas e que são causa do seu sofrimento, bem como aquilo que poderia tê-lo impedido de cometê-las; compreende a justiça da posição que lhe é dada e procura então a existência necessária para reparar a que acaba de escoar-se. Procura provas semelhantes àquelas por que passou, ou as lutas que acredita apropriadas ao seu adiantamento, e pede a Espíritos que lhe são superiores para o ajudarem na nova tarefa. Assim, geralmente, um Espírito protetor que aceitou essa tarefa por missão, como um pai, procurará conduzir o seu protegido pelo bom caminho para ajudá-lo com os seus conselhos, consolá-lo nas suas aflições, sustentar sua coragem nas provas da vida (4), dando-lhe, assim, uma espécie de intuição.

Quando nesta vida temos o desejo (tentação) de praticar uma má ação, coisa que frequentemente nos assalta, e no qual resistimos instintivamente, podemos atribuir a nossa resistência, na maioria das vezes, aos princípios que recebemos de nossos pais ou mestres, ao mesmo tempo, que a voz da consciência também nos adverte, e essa voz é a recordação do passado, voz esta que nos avisa para não cometermos as mesmas faltas de outra(s) vida(s). Assim, se nesta nova existência, o Espírito sofrer as suas provas com coragem e souber resistir, eleva-se a si próprio e ascenderá na hierarquia dos Espíritos, quando tiver que voltar para o meio deles.

A lembrança de nossas individualidades anteriores teria gravíssimos inconvenientes. Poderia, em certos casos, humilhar-nos extraordinariamente; em outros, exaltar o nosso orgulho, e por isso mesmo entravar o nosso livre arbítrio. Deus nos deu, para nos melhorarmos, justamente o que nos é necessário e suficiente: a voz da consciência e nossas tendências instintivas, tirando-nos aquilo que nos poderia prejudicar. (5) Acrescentemos ainda que, se tivéssemos a lembrança de nossos atos pessoais anteriores, teríamos a dos atos alheios, e esse conhecimento poderia ter os mais desagradáveis efeitos sobre as relações sociais. Não havendo sempre motivo para nos orgulharmos do nosso passado é quase sempre uma felicidade que um véu seja lançado sobre ele. Isso concorda perfeitamente com a doutrina dos Espíritos sobre os mundos superiores ao nosso. Nesses mundos, onde não reina senão o bem, a lembrança do passado nada tem de penosa; é por isso que neles se recorda com frequência a existência precedente, como nos lembramos do que fizemos na véspera. Quanto à passagem que se possa ter tido por mundos inferiores, a sua lembrança nada mais é do que um sonho mau.

Como nem sempre podemos ter algumas revelações sobre as nossas existências anteriores, entretanto, muitos sabem o que foram e o que fizeram e se lhes fosse permitido dizê-lo abertamente, fariam singulares revelações sobre o passado.

Algumas pessoas creem ter a vaga lembrança de um passado desconhecido, vislumbrado como a imagem fugitiva de um sonho que em vão se procura deter. Essa vaga lembrança, algumas vezes, é real, porém, na maioria das vezes, é também uma ilusão, contra a qual deve-se precaver, pois pode ser o efeito de uma imaginação superexcitada.

Nas existências corpóreas de natureza mais elevada que a nossa, a lembrança das existências anteriores é mais precisa, ou seja, à medida que o corpo é menos material, a recordação se faz melhor.

As tendências instintivas do homem, sendo uma reminiscência do seu passado, pelo estudo dessas tendências (autoconhecimento), até certo ponto, ele poderá reconhecer as faltas que cometeu, mas é necessário ter em conta a melhora que se possa ter operado no Espírito e as resoluções que ele tomou no seu estado errante, assim, a existência atual pode ser muito melhor que a precedente. [6] E, também, dependendo do seu adiantamento. Se ele não souber resistir às provas, pode ser arrastado a novas faltas que serão a consequência da posição por ele mesmo escolhida. Mas em geral essas faltas denunciam antes um estado estacionário do que retrógrado, porque o Espírito pode avançar ou se deter, mas não recuar (7).

Sendo as vicissitudes da vida corpórea ao mesmo tempo uma expiação das faltas passadas e provas para o futuro, muito frequentemente, segue-se que, da natureza dessas vicissitudes, possa induzir-se o gênero da existência anterior, pois cada um é punido (8) naquilo em que transgrediu da Lei Natural. Entretanto, não se deve tirar daí uma regra absoluta; as tendências instintivas são um índice mais seguro, porque as provas que um Espírito sofre, tanto se referem ao futuro quanto ao passado.

Chegado ao termo que a Providência marcou para a sua vida errante, o Espírito escolhe por si mesmo as provas às quais deseja submeter-se, para apressar o seu adiantamento, ou seja, o gênero de existência que acredita mais apropriado a lhe fornecer os meios, e essas provas estão sempre em relação com as faltas que deve expiar. Se nelas triunfa, ele se eleva; se sucumbe, tem de recomeçar.

O Espírito goza sempre do seu livre arbítrio. É em virtude dessa liberdade que, no estado de Espírito, escolhe as provas da vida corpórea, e no estado de encarnado delibera o que fará ou não fará, escolhendo entre o bem e o mal. Negar ao homem o livre arbítrio seria reduzi-lo à condição de máquina.

Integrado na vida corpórea, o Espírito perde momentaneamente a lembrança de suas existências anteriores, como se um véu as ocultasse. Não obstante, tem às vezes uma vaga consciência, e elas podem mesmo lhe ser reveladas em certas circunstâncias. Mas isto não acontece senão pela vontade dos Espíritos superiores, que o fazem espontaneamente, com um fim útil, e jamais para satisfazer uma curiosidade vã.

As existências futuras não podem ser reveladas em caso algum, por dependerem da maneira por que se cumpre a existência presente e da escolha ulterior do Espírito.

O esquecimento das faltas cometidas não é obstáculo à melhoria do Espírito, porque, se ele não tem uma lembrança precisa, o conhecimento que delas teve no estado errante e o desejo que concebeu de as reparar, guiam-no pela intuição e lhe dão o pensamento de resistir ao mal. Este pensamento é a voz da consciência, secundada pelos Espíritos que o assistem, se ele atende às boas inspirações que estes lhe sugerem.

Se o homem não conhece os próprios atos que cometeu em suas existências anteriores, pode sempre saber qual o gênero de faltas de que se tornou culpado, e qual era o seu caráter dominante. Basta que se estude a si mesmo, e poderá julgar o que foi, não pelo que é, mas pelas suas tendências.

As vicissitudes da vida corpórea são, ao mesmo tempo, uma expiação das faltas passadas e provas para o futuro. Elas nos depuram e nos elevam, se as sofremos com resignação e sem murmúrios.

A natureza das vicissitudes e das provas que sofremos pode também esclarecer-nos sobre o que fomos e o que fizemos, como neste mundo julgamos os atos de um criminoso pelo castigo que a lei lhe inflige. Assim, este será castigado no seu orgulho (9) pela humilhação de uma existência subalterna; o mau rico e avarento, pela miséria; aquele que foi duro para os outros, pelo tratamento duro sofrerá; o tirano, pela escravidão; o mau filho, pela ingratidão dos seus filhos; o preguiçoso, por um trabalho forçado, etc.

NOTAS

(1) Ver Allan Kardec em O Livro dos Espíritos, Livro segundo, cap. IV, Ideias Inatas, item 218.

(2) Ver Allan Kardec na Revista Espírita de março de 1867, Da Homeopatia nas Doenças Morais.

(3) Ver Allan Kardec em O Livro dos Espíritos, Livro segundo, cap. IV, Semelhanças Físicas e Morais, item 216.

(4) Ver Allan Kardec em O Livro dos Espíritos, Livro segundo, cap. IX, Anjos da Guarda, Espíritos Protetores, Familiares ou Simpáticos, item 489 e seguintes.

(5) O Espiritismo ensina que a lembrança precisa das faltas de encarnações passadas traria inconvenientes extremamente graves, em que isso nos perturbaria, nos humilharia aos nossos próprios olhos e aos de nossos próximos; que nos traria uma perturbação nas relações sociais, e que, por isso mesmo, entravaria nosso livre arbítrio. De um outro lado, o esquecimento não é tão absoluto quanto se supõe; não ocorre senão durante a vida exterior de relação, no próprio interesse da Humanidade; mas a vida espiritual não tem solução de continuidade; o Espírito, seja na erraticidade, seja em seus momentos de emancipação, se lembra perfeitamente, e essa lembrança lhe deixa uma intuição que se traduz pela voz da consciência que o adverte do que deve fazer ou não fazer; se não a escuta, é, pois, culpado. O Espiritismo dá, além disso, ao homem um meio de remontar ao seu passado, senão nos atos precisos, pelo menos nos caracteres gerais desses atos que pesaram mais ou menos sobre a vida atual. Das tribulações que sofre, expiações ou provas, deve concluir que foi culpado; da natureza dessas tribulações, ajudado pelo estudo de suas tendências instintivas, e apoiando-se sobre o princípio de que a punição mais justa é aquela que é a consequência de sua falta, pode deduzir disso seu passado moral; suas más tendências lhe mostram o que resta de imperfeito a corrigir em si. A vida atual é para ele um novo ponto de partida; aqui chega rico ou pobre de boas qualidades; basta-lhe, pois, estudar-se a si mesmo (#) para ver o que lhe falta e dizer: “Se sou punido, é porque pequei (##), e a própria punição lhe dirá o que fez. (Ver Allan Kardec, Revista Espírita de setembro de 1863, Perguntas e Problemas: Sobre a Expiação e a Prova.)

(#) O autoconhecimento é o meio prático mais eficaz para se melhorar nesta vida é resistir ao arrastamento do mal, é assim que ensinava um sábio da Antiguidade (Sócrates) com o "Conhece-te a ti mesmo". (Ver Allan Kardec em O Livro dos Espíritos, Livro terceiro, cap. XII, Perfeição Moral, item 919 e seguintes.)

(##) Deduzimos que no caso do Espiritismo a palavra pecado significa um erro intencional, ou seja, tem-se o conhecimento do ato que vai praticar, mas não se consegue resistir a tentação e assim a má ação é praticada. De qualquer maneira o castigo é sempre proporcional a intenção e a capacidade evolutiva do culpado. "A quem muito foi dado, muito será exigido; e a quem muito foi confiado, muito mais será pedido". Lucas 12:48. (Nota do A Era do Espírito).

(6) As pessoas que tanto se interessam por saber o que foram em vidas anteriores devem prestar atenção a estes itens. Pelo estudo de suas tendências atuais, não esquecendo o progresso que devem ter realizado, teriam uma ideia do que foram e do que fizeram. (Nota de J. Herculano Pires)

(7) O Espírito não retrograda da mesma maneira que o rio não remonta a sua fonte, assim, os Espíritos não podem degenerar. A medida que avançam, compreendem o que os afasta da perfeição. Quando o Espírito conclui uma prova, adquiriu conhecimento e não mais o perde. Pode permanecer estacionado, mas não retrogradar. (LE Ver Allan Kardec em O Livro dos Espíritos, itens 118 e 612),

(8) O homem sofre sempre a consequência de suas faltas; não há uma só infração à lei de Deus que fique sem a correspondente punição. A severidade do castigo é proporcionada à gravidade da falta. Indeterminada é a duração do castigo, para qualquer falta; fica subordinada ao arrependimento do culpado e ao seu retorno a senda do bem; a pena dura tanto quanto a obstinação no mal; seria perpétua, se perpétua fosse a obstinação; dura pouco, se pronto é o arrependimento. Desde que o culpado clame por misericórdia, Deus o ouve e lhe concede a esperança. Mas, não basta o simples pesar do mal causado; é necessária a reparação, pelo que o culpado se vê submetido a novas provas em que pode, sempre por sua livre vontade, praticar o bem, reparando o mal que haja feito. (Ver Allan Kardec, O Evangelho Segundo o Espiritismo - Capítulo XXVII - Pedi e obtereis - item 21).

(9) O castigo é o aguilhão que estimula a alma, pela amargura, a se dobrar sobre si mesma e a buscar o porto de salvação. O castigo só tem por fim a reabilitação, a redenção. Querê-lo eterno, por uma falta não eterna, é negar-lhe toda a razão de ser. (Ver Allan Kardec, Comunicação de Paulo, Apóstolo dada para a questão 1009 de O Livro dos Espíritos).

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